sábado, 20 de agosto de 2011

OSMAR FALA PELA 1ª VEZ DEPOIS DA DERROTA PARA BETO.

Wenderson Araújo /
Da Gazeta do Povo / Conexão Brasilia
O texto abaixo é a íntegra da entrevista concedida pelo ex-senador Osmar Dias (PDT) na última segunda-feira, em Brasília. O material editado está disponível na edição impressa da Gazeta do Povo deste domingo:
Do 24.º andar do edifício-sede do Banco do Brasil (BB), Osmar Dias enxerga a Praça dos Três Poderes por cima, mas de longe. Após 16 anos no Senado, o paranaense diz estar feliz pela distância momentânea da política e como vice-presidente de agronegócios do BB. Graças ao cargo, que também abrange o atendimento a micro e pequenas empresas, o engenheiro agrônomo voltou a ter contato direto com os produtores rurais.
Sob o guarda-chuva de Osmar está 42% de todo crédito oferecido pelo banco. São mais de R$ 140 bilhões divididos entre 5 milhões de clientes. Atarefado e amarrado pelas regras do estatuto do banco, ele afirma que não tem atuado “na prática” como presidente estadual do PDT.
Desde a derrota nas eleições para governador do Paraná, em outubro de 2010, Osmar não concedeu entrevistas sobre a campanha. Quebrou o silêncio na segunda-feira passada. Apesar do afastamento, não perdeu o tom crítico.
Elogiou a presidente Dilma Rousseff, mas disse que ela precisa ouvir mais opiniões externas. Sobre a gestão Beto Richa (PSDB), foi mais além. “Tenho visto o Beto falar muito mal do governo passado. Mas isso não é suficiente para ele cumprir os compromissos que assumiu.”

Após 16 anos no Senado, como está a rotina como vice-presidente do Banco do Brasil?

A primeira coisa que eu fiz quando cheguei ao banco foi dizer que eu trazia o pensamento do produtor rural. É assim que eu posso contribuir com uma instituição que tem 203 anos e que, para essa função, não precisa de mais uma pessoa com conhecimento bancário. Eu posso e estou trazendo ideias novas para ajudar a fazer com que o BB, que já é o maior banco de crédito rural do mundo, possa ser ainda mais aperfeiçoado.
Quando senador, o sr. costumava citar uma colocação do seu pai de que o filho havia abandonado a “melhor profissão do mundo” (agricultor) para dedicar-se à “pior” (político). Essa nova tarefa no BB é uma volta às origens?
Aqui eu posso ver os resultados do trabalho com mais rapidez e clareza. No Legislativo, você trabalha anos a fio para elaborar e aprovar um projeto e os resultados muitas vezes não são dimensionados pela sociedade. No banco, quando você participa de uma decisão sabe que ela está influenciando na vida de milhares de pessoas e vê o resultado. Para mim, tem sido uma nova escola de vida. Quando cito meu pai é com muito orgulho porque ele falava da agricultura com prazer, nobreza. Mas acho que ele até errou quando me aconselhou a não entrar na política. Hoje eu avalio que cumpri minha missão no Senado com a maior correção possível.

Tem sido possível conciliar o trabalho no BB com a política?

Eu não tenho me dedicado à política. Tenho me dedicado apenas aos assuntos da agricultura brasileira, aos assuntos do banco. Não tenho participado nem das reuniões do partido. Tenho procurado delegar minhas posições aos outros colegas do PDT, que podem fazê-lo com mais tempo que eu. Até porque o estatuto do BB é bastante rigoroso com relação a isso. Eu sou de cumprir as regras do local em que trabalho.
Tem feito bem ao sr. essa distância da política?
Muito bem. Estou bastante aliviado. Creio que era um direito que eu tinha depois de tanta luta na política, trabalhando de uma forma que talvez não seja a mais tradicional. A convencional é a política de favores, que eu nunca fiz. Eu precisava de um tempo para pensar, para refletir a respeito do meu passado e também sobre o futuro.

Como o sr. avalia o governo Dilma?

Se você olhar os projetos que a presidente lançou e os que estão em desenvolvimento percebe que são ideias que aperfeiçoam tudo o que foi feito no governo Lula, quando houve um avanço significativo na área social e na distribuição de renda do país. Se fosse apenas isso o destaque na mídia, a gente chegaria à conclusão de que é um governo excelente. Só que esses feitos têm sido prejudicados pela crise financeira internacional e pela crise política. Só que essa crise política não é de agora e a presidente tem tomado atitudes enérgicas. Eu confio que uma limpeza será feita. Isso precisa ser feito de forma impiedosa. Não dá para ser complacente com a corrupção. Mas ela está agindo dentro da forma que é possível fazer.
É possível levar essa faxina adiante?
Ela vai precisar de muito apoio da sociedade, que precisa ficar em cima do Congresso. E o governo precisa do apoio do Legislativo. Isso é uma coisa séria, não é só um argumento para evitar CPI. É uma questão de estabilidade, de governabilidade. O que não pode haver é a troca de favores dos partidos no sentido de não permitir a investigação. Estamos passando por uma crise de honestidade. Precisamos ter em mente que não há corrupção sem corruptor. É preciso haver conscientização dos eleitores. A generalização de que todos os políticos são desonestos ajuda exatamente os desonestos. Esse é um erro muito grave. Hoje eu não sou congressista e posso dizer de fora que lá tem muita gente séria. A mídia deveria dar mais crédito a essas pessoas, porque caso contrário não vale à pena ser político.

Para o senhor ainda vale à pena?

Vale. Só o crivo pelo qual eu tive de passar para ser admitido na minha função aqui no banco já prova que eu sempre fiz as coisas direito. Não é todo político que cumpriria as exigências formais para estar aqui. Mas vai valer mais à pena quando a sociedade começar a apartar os bons e os maus políticos.
E a questão do loteamento político do governo?
Eu sou contra o critério de que os partidos que apoiaram a presidente na eleição precisam ter uma participação porcentual no governo. Esse critério é que dá margem a esse tipo de comportamento de alguns partidos.

Mas o partido do sr. também se beneficiou do loteamento, não?

Eu não estou aqui pelo meu partido. Se fosse pelo PDT, eu nem estaria. O meu partido tem um ministério [do Trabalho], mas no meu entendimento é um erro.

Então o sr. não faz parte da “cota” partidária, é isso?

Não. Eu não aceitaria estar aqui se não fosse pelo conhecimento que eu tenho da agricultura. Se eu tivesse a mínima impressão de que estou no cargo meramente por uma questão política, compensatória, eu não estaria aqui.

E é possível deslotear o governo?

É possível. A oportunidade para começar é quando um partido faz uma nomeação equivocada. Se indicou errado, não pode indicar de novo. Quem foi eleito para comandar o país foi o presidente. O grande salto que a presidente Dilma poderia dar era escolher um conselho político para ajudá-la a escolher pessoas para governar o país com mais qualidade. Digo mais: ela deveria formar um grupo de pessoas que não fosse ao palácio só para fazer média, para agradar. Mas que tivesse o direito de dizer para ela o que poderia ser feito de melhor que o que já está sendo feito. Ninguém pode prescindir de sugestões e críticas.
O sr. acha que as pessoas não conseguem chegar até ela?
Eu acho que o cargo de presidente cria uma dificuldade para as pessoas dizerem o que pensam para a presidente. Ainda mais pelo estilo da presidente Dilma. É um estilo que muitas vezes deixas as pessoas assim: “se eu falar, ela vai ficar brava”. Não importa se vai ficar brava. Às vezes a pessoa pode contribuir com uma crítica muito mais do que com uma bajulação. A presidente não precisa de bajulação. Ela poderia ter algumas pessoas graduadas, ainda que sem cargo no ministério, que pudessem ser chamadas para opinar e fazer críticas.
O sr. integrou a base dos governos FHC e Lula e criticou ambos. Falta esse tipo de postura?
Quando eu fiz críticas ao governo Fernando Henrique e estava no PSDB diziam que eu era incoerente. Incoerente é aceitar tudo como vaca de presépio. Quando eu critiquei o Lula, os jornais publicaram depois para questionar que ele estava me apoiando na eleição do ano passado. Mas será que os dois eram infalíveis, que não mereciam ser criticados? Eu não tinha o direito de falar o que eu pensava? Quando eu assinei a CPI da Corrupção [em 2001] e o Fernando Henrique me chamou no palácio para retirar a assinatura, ele estava certo? Agora [em 2011], quando a oposição quer a CPI, para que fazer um esforço imenso para não deixá-la acontecer? Se é para fazer limpeza, deixa a CPI investigar. Desde que seja séria, para investigar mesmo e não só para fazer barulho.
É parecida essa CPI proposta pela oposição para investigar o governo Dilma com a CPI da Corrupção de dez anos atrás, quando o sr. e o senador Alvaro Dias acabaram sendo forçados a deixar o PSDB?
É muito parecida. Até porque daquela vez não houve CPI. Em 2001, havia 32 assinaturas favoráveis à instalação, que era bem mais do que as 27 necessárias. Mas aí os senadores foram retirando os nomes e acabou estacionando em 26. Eu mantive a assinatura, o Alvaro também, precisamos sair do partido para não sermos expulsos, mas a investigação não saiu.
Qual avaliação o sr. faz do governo Beto Richa no Paraná?
Tenho visto o Beto falar muito mal do governo passado. Mas isso não é suficiente para ele cumprir os compromissos que assumiu durante a campanha. Só falar mal do governo passado não basta. Mas eu não quero aprofundar essa avaliação, porque outro dia uma colega sua falou que isso era mágoa de quem foi derrotado. Eu nunca me senti derrotado. Disputei uma eleição conhecendo todas as dificuldades que iria enfrentar. Quando eu falo, é porque eu tenho obrigação de falar o que eu penso. Embora ocupando um cargo aqui no BB, não deixei de ser paranaense. É preciso que a população tenha em mente as promessas que foram feitas e que ela também faça uma avaliação de quanto dessas promessas foram cumpridas. Eu não me esqueci de nenhuma delas.

Tem alguma que o senhor acha que já deveria ter sido cumprida nesse prazo de pouco mais de sete meses de governo?

Por exemplo: ele disse que no dia 2 de janeiro o salário dos professores iria aumentar 26%. Isso foi dito num debate para mim. Talvez eu tenha me esquecido de perguntar o ano. Vamos deixar só nesse.
O mais marcante para o sr. então é essa menção recorrente aos problemas do governo passado?
O que estou dizendo é que isso não é suficiente para que um governo tenha a confiança da população até o final do mandato. É preciso que as promessas sejam todas lembradas e cumpridas. Vamos esperar que tudo isso seja cumprido até o final do mandato, porque vai ser bom para o Paraná.

Tem alguma possibilidade de reaproximação política com o governador?

Eu não penso em política neste momento.
Mas há um tema que tem envolvido muito seu nome no estado que é a filiação do ex-deputado Gustavo Fruet ao PDT. Ela já está definida?
Eu tenho conversado com o Gustavo sempre que tenho oportunidade, pessoalmente e por telefone. Tenho colocado a possibilidade de ele vir para o PDT. Ele tem o convite do presidente nacional, o meu, a garantia da candidatura a prefeito de Curitiba e do comando do diretório municipal. A decisão agora cabe a ele. O Gustavo tem buscado formar uma aliança que dê a ele as condições de disputar uma eleição majoritária. E está certo. Eu também sempre agi assim e às vezes era criticado por demorar a decidir. Como é que ele pode dizer que é candidato sem ter alianças e depois ficar isolado fazendo papel de bobo?

Vale a pena repetir uma aliança nos moldes que o sr. teve no ano passado?

Outro dia me perguntaram sobre isso e eu disse que não iria jogar essa praga no Gustavo. Gosto muito dele, embora ele não tenha me apoiado na última eleição. Eu creio que a aliança tem de ser para valer. A aliança que foi feita comigo foi na verdade algo para atender alguns interesses que não eram a minha candidatura. Isso explica, em parte, o resultado da eleição. Quando eu disse isso lá atrás falaram que eu estava arrumando culpados. O Paraná inteiro sabe que grande parte do PMDB, que era o maior partido da minha chapa, não me apoiou.
Mais partidos se comportaram dessa forma?
Citei o PMDB porque era o maior partido da aliança. Mas houve gente até do meu partido que fez isso. É só pegar os resultados das eleições.
Do quadro de lideranças da sua chapa, qual porcentagem de apoio o sr. realmente teve?
Difícil medir assim, mas a gente sabia que dos 16 deputados estaduais talvez eu ficasse com seis. Agora, o que eu posso dizer? Qual é a opinião que eu posso ter de um deputado que se elege na minha coligação e que depois ganha como “prêmio de lealdade”, esse termo foi usado pelo governador, um cargo em uma secretaria de estado? A lealdade dele, na verdade, não foi uma traição? Ele merece ser premiado por ter traído? Esse tipo de política não dá para mim, eu não consigo fazer.
Quais diferenças o sr. vê entre as campanhas de 2006 e 2010?
Em 2006, nós tivemos uma aliança pequena, mas que foi leal e por isso chegamos muito perto da vitória. Fatores alheios à política levaram a esse resultado, que poderia ter sido positivo. Em 2010, eu sabia que teria muita dificuldade, até pela forma como foi constituída a aliança. Parte dos líderes partidários queriam a parceria, mas a maioria dos membros já estavam entregues a outros projetos. Você não ganha uma aliança sem um apoio consistente. E se você voltar à história do Paraná, o último governador do interior eleito foi o Alvaro [1986], ainda assim porque não tinha um prefeito da capital concorrendo. Eu tinha uma candidatura tranquila para o Senado, mas atendi o apelo de muita gente, inclusive do presidente Lula. Acredito que fiz a minha parte, dando um palanque forte à Dilma no Paraná. Minha candidatura teve importância pelo projeto nacional.

O PT se enquadra nesse grupo de desleais aos quais o sr. se refere?

Não. O PT foi um partido que cumpriu os compromissos. Mesmo alguns que não me viam como o candidato dos sonhos por problemas ideológicos. Particularmente, acho uma bobagem. Tem de ter projeto e decência na minha vida pública. Mesmo os que tinham restrições a mim deixaram isso de lado e fizeram campanha. Minha satisfação é encontrar muitos petistas e ouvir deles que eles tinham uma posição muito equivocada a meu respeito. Outro sinal interessante é que depois da campanha os movimentos sociais me procuraram perguntando se eu precisava de apoio para fazer parte do governo Dilma.
O sr. tinha medo de não se entrosar com os petistas?
Pelo contrário. Eu tinha certeza que iria me entrosar com o PT. Claro que tem alguns radicais, mas o que importa é a maioria. E eu sempre me dei muito bem com a maioria do PT. Sempre me entendi bem com o Lula. Durante a campanha nós aprofundamos a amizade. Depois, o Lula nunca deixou de me telefonar para me dar apoio.
Em meados de 2011, parecia que o sr. estava convencido a ser candidato a senador. O que aconteceu?
Eu saí de uma eleição muito dura em 2006. Tem gente na política que se candidata por vaidade. Eu nunca tive vaidade. Em 2006 eu tinha um projeto que eu achava melhor do que aquele que ganhou a eleição. Em 2010 eu tinha um projeto realista, que achava que poderia ser executado. Mas antes disso eu tinha tomado uma decisão de concorrer ao Senado porque teria muitas dificuldades de montar uma aliança. E eu também tinha um compromisso de que o Beto ficaria na prefeitura até 2012. No momento em que ele não cumpriu a palavra empenhada, eu decidi que seria candidato ao Senado. Num período de abril até junho eu conversei com os dois lados. Aí surgiu aquele problema do Alvaro ser candidato a vice-presidente na chapa do José Serra, que não se concretizou. Eu não seria candidato a governador numa chapa contrária à do meu irmão. 

O que fez o sr. mudar de ideia?

Às vezes você precisa tomar decisões que custem um mandato para não se desmoralizar. Eu seria desmoralizado se não fosse candidato a governador. Eu ofereci um projeto diferente, uma alternativa à população. Seria muito ruim se todos aparecessem defendendo um só projeto para o Paraná, que afinal de contas eu nem sei se existe. Eu não ganhei, mas saí com a cabeça erguida da campanha. Não saí me sentindo diminuído. Eu cumpri uma missão de cidadão. Dei oportunidade para os paranaenses fazerem uma opção. Da minha parte, tenho orgulho das minhas filhas, da minha família inteira. Da minha família inteira não, mas da minha família. Tenho certeza que cumpri um papel importante.
O que aconteceu realmente durante o episódio em que seu irmão, Alvaro, foi anunciado na vice de Serra?
Para você mesmo eu disse muitas vezes que eu não disputaria uma eleição contra o Alvaro. Vou repetir isso e quero muito que seja publicado. Essa dúvida não pode ficar. Eu não disputaria uma eleição contra meu irmão porque seria desrespeitoso com o eleitor e com a gente. Foi muito dolorosa para mim aquela notícia de que ele poderia ser vice. Eu recebi a notícia de que ele não seria candidato de lideranças nacionais do DEM. A convenção que decidiu as candidaturas foi no domingo. No domingo de manhã eu me reuni com toda cúpula do PT e do PMDB e anunciei que não seria candidato a governador. Na terça-feira à noite chegou a notícia de que o vice não seria mais o Alvaro. Aí eu não tinha mais motivos para deixar de ser candidato. A decisão foi tomada com o apoio de todas as lideranças. Aliás, se eu tivesse aquele mesmo apoio durante a campanha seria uma maravilha. O duro foi aguentar calado as acusações de que eu não cumpri o acordo [com o PSDB]. É a primeira vez que eu estou dizendo isso. Tudo foi feito dentro do que tinha sido combinado. Se o PSDB tivesse consumado a candidatura do Alvaro a vice-presidente, eu não seria candidato a governador. Mas não foi o que aconteceu.
Daqui para frente, o que o senhor pretende fazer?
Uma coisa eu garanto: não vou, neste momento, decidir o que eu farei em 2014. Em 2012 eu já decidi. Vou continuar aqui no banco, obedecendo todas as restrições que o estatuto do banco me coloca para participar de uma candidatura política. Sobre 2014, está muito longe

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